domingo, outubro 24, 2004

CRÔNICA DE MORTES MORRIDAS ANUNCIADAS

A guerra é um horror. A guerra no Iraque é um horror maior ainda, depois que fiquei sabendo, pelo portal Gazeta On Line, conforme notícia de última hora, que “Corpos de 49 soldados iraquianos são encontrados mortos”. Tamanha galhardia na arte da execução coletiva mostra que matar os vivos agora é pouco. Quem duvida do pleonástico massacre pode ser conferir em: http://gazetaonline.globo.com/minutoaminuto/minutoaminuto_materia.php?id=0417b8cef89374.

A vida lá fora

Acho que sou feliz por não morar em Vitória, a capital do Espírito Santo. Por curiosidade, fui investigar o nível de um Chat local, sexta à noite, supostamente destinado aos nativos. Não deu outra: só tinha viado ou então heteros em busca de sexo virtual. Quase todos se identificando através de um código de faculdades reprodutivas bastante objetivo, baseado em letras e números (identificação do sexo, orientação sexual, alegado tamanho da piroca, estado civil e idade). Por exemplo, um homem homossexual casado (supõe-se tratar-se de segredo contra o qual nada deveria alegar sua senhora), dizendo ter 19 cm de pênis em ereção, passivo, de 52 anos, terá a seguinte identificação naquele mundinho cor-de-rosa: HxH.C.19.P.52 . (Em resumo: Homossexual masculino, casado, 19 cm, passivo e 52 anos). Alguns adicionam um apelido denotando vantagem étnica ou estado de espírito, como: negãoHxH.C.19.P.52, necessitadoHxH.C.19.P.52, ou ainda, o que é mais trágico, “carente-sinceroHxH.S.12.P.30. É um nojo que os usuários do UOL tem que suportar. Felizmente transformo-me num reladrum ( Red Labeled Drunk Men) antes de conseguir contatar qualquer forma de vida inteligente nesses chats, ficando impossibilitado de digitar as ofensas que essa choldraborra merece. Entrei numa dessas salas sob o sugestivo pseudônimo de “Chaim_Perelman”. É evidente que ninguém demonstrou estar chocado e fiquei convencido de que é melhor ir beber.

domingo, outubro 17, 2004

MY NAME IS NOBODY

Encerrado o pleito para vereador, os candidatos anônimos finalmente são revelados ao público através das listas dos Tribunais Eleitorais. Muitos só tem aí a oportunidade de mostrar ao menos o nome no jornal, ao lado de um número pífio, geralmente menor que 10 (dez), lá à guisa de votos totais. Tudo está acabado com cinco, seis, talvez dez , contando a boa vontade dos colegas do mutirão da casa da dona nenê. Mas é nisso que vem a Dona Nenê Mãe do Natal, candidata de município longínquo. Talvez ela seja alguma espécie de parente do Papai Noel, de boa lembrança. Na beira da lanterna, encostando na Mãe do Natal, o Trololó, pouco à frente do Sebastiãzão, assim mesmo, com dois til. Me contaram também da derrotada “Gilda, Simplesmente Gilda”, ou simplesmente alguma coisa. Uma conhecida da família em município distante reclamou à justiça eleitoral seus 11 votos, provavelmente sem ter notado no horror que deve ter causado aos seus pretensos eleitores, na hora H, a visão de sua foto na tela da urna eletrônica. Não é à toa que essas infâmias ocorrem. O pessoal procura a neutralização política. Uma candidata subiu ao palanque lotado em concorrido comício em município distante para reclamar do estado das principais instituições: hospital, creche e escolinha. E foi: “O hospital está carente, a creche está carente. A escolinha, coitada, está carente. O que a gente precisa é incentivar a carência!”. As eleições num Brasil do século XXI serão lembradas pela saudade da prática da troca de tiros, hoje em desuso. A festa da democracia já foi mais divertida antes da invasão de palhaços e cuspidores de fogo.

sábado, outubro 02, 2004

A solidão e a vida interior

Todo intervalo é um momento de reflexão. Numa rave, numa reunião de condomínio ou numa aula de Direito Previdenciário o intervalo é momento de revisão das origens de nosso desespero e, claro, de reflexão. São vagos que são preenchidos por uma pauta esclarecedora. Esses interregnos que nos arremessa para a infinita angústia de nossa existência num mundo sem sentido logo conduz à ruína e à desilusão. É para momentos assim que minha memória sempre procura resgatar todo o Adágio for Strings de Samuel Barber, que toda vitrola mental que se preze deveria tocar por inteiro em frações de segundo nos infinitos intervalos de uma existência horrenda.